Era 2008 e eu andava na oitava classe na Escola Secundária Geral de Coalane, em Quelimane. Primeira classe do ensino secundário e muita coisa era nova para mim, portanto. Novas disciplinas, novos amigos e nova escola. Nesta época, fiz amizade fechada com um colega de nome Bernardino Uaquela Bca
No entanto, num desses dias da nossa jornada académica daquele ano, Bernardino informou-me que havia algumas vagas de voluntariado abertas no Clube da Criança da Rádio Moçambique, emissor provincial da Zambézia e, como eu andava a procura de algo diferente que me pudesse ocupar, vi ali a minha única chance de abraçar o desafio. Procurei saber com o Bernardino sobre os requisitos e procedimentos para candidatar-se e ele explicou-me que simplesmente teria que me dirigir à Rádio na manhã do sábado seguinte e apresentar a minha intenção.

Ficamos ali até oito horas e, foi então que uma senhora de estatura média, clara e de uma voz suave chegou e saudou-nos a todos perguntando: - Vocês estão aqui por causa daquela vaga de voluntariado? – Sim! Respondemos em corro. Imediatamente ela convidou-nos a entrar para a sala do Clube de Rádio da Criança (CRC) e explicou-nos de como seria a competição.
“Olá a todos, sejam bem-vindos a CRC. Chamo-me Elsa Germano e sou a coordenadora do CRC. Para que cada um aqui nesta sala seja aceite como voluntário do CRC deverá ler um trava-língua de forma rápida, sem falhas. Quem conseguir fazer isto com sucesso será integrado no CRC a partir de hoje. Aqui está o desafio” – disse, enquanto entregava-nos um papel com o seguinte texto:
“Num ninho de mafagafos, quatro mafagafinhos há. Quem mafagafar os mafagafinhos, bom mafagafinhador será”.
Parece um texto simples, mas acreditem que houve quem não conseguiu passar, porque, de facto, ler isto de forma rápida e sem gafes não é coisa para todos LOL. Enfim, feita a prova oral, graças à Deus fui aprovado para colaborador voluntário do CRC. Portanto, a partir daquele momento, a minha vida deu uma volta de 360 graus.
O CRC era um centro que, para além de produzir programas radiofónicos infanto-juvenis em língua portuguesa, e-chwabo e e-lomwe, servia de um lugar de empoderamento social e cultural das crianças. Foi lá onde tive o meu primeiro contacto com o computador, uma mesa de edição de aúdio, um microfone e, com apoio de outras crianças, aprendi a dominar todas estas tecnologias providas pelo CRC. O meu gosto pelo CRC foi crescente que, por fim, acabei me apaixonando.
Por causa desta paixão, a minha rotina de vida alterou-se completamente. Lembro-me que saía de casa muito cedo, sem tomar o pequeno-almoço, para CRC, depois seguia para escola, a seguir ia para Igreja e finalmente à casa onde teria a oportunidade de tomar a minha única refeição. Esta rotina, desgastante para alguns, mas adorável para mim, acompanhou-me durante cinco anos (2008-2012).
As pessoas sempre questionavam-me porquê dedicava-me tanto para uma coisa que não dava dinheiro? E eu nunca tinha resposta para este tipo de perguntas. Eu apenas gostava do que fazia, de tal forma que a jornada era mais interessante que qualquer beneficio dali advindo.
Vale a pena dizer que, enquanto no CRC, desempenhei as funções de sonoplasta, produtor e apresentador do mais prestigiado programa de educação denominado “Mundo Sem Segredos”, do programa infantil “Vamos Brincar e Aprender” e “Novos Horizontes”, que mais tarde veio chamar-se “Visão Jovem”.
Foi pelo CRC que recebi o meu primeiro subsídio na vida, resultante do meu empenho e reconhecimento. Foi graças ao CRC que fiz a minha primeira viagem inter-distrital para Maganja da Costa e primeira viagem Inter-provincial para a Província de Cabo Delgado. Foi graças ao CRC que, de 2013-2015, colaborei com a Antena Nacional da Rádio Moçambique, em Maputo, nos programas “Último Tempo” e “Zona Quente”. Foi no CRC onde aprendi, desenvolvi e amadureci inúmeras habilidades e estabeleci valiosos contactos que até hoje me são úteis. Por meio do CRC conheci figuras como: Coutinho, Jose, Santana, Mujaide, Eunice, Iloyah, Farzana, Zito, Gil, Otília, Gércio, Arafat, Cecilia, Alexandre, Ivan, Djhdias, Virgilio, Inacio, Sumali, Abilio, Amilcar entre várias outras, incluindo Jornalistas.
Como se pode notar nesta história, não existe uma oportunidade certa para ninguém, apenas devemos agarrar firme todas as oportunidades que a vida nos oferece e colocarmos o amor acima de tudo e veremos que tudo o resto nos será canja. Não fique a espera de uma oportunidade certa, abrace-as quantas puder e mantenha uma mente aberta.